quarta-feira, 26 de outubro de 2011

Me Brincar

"Eu preciso descobrir 
A emoção de estar contigo
Ver o sol amanhecer
E ver a vida acontecer
Como num dia de domingo"



Contrariando as leis que tornam a vida menos absurda, ele não sorri por delicadeza, não se esforça para ser agradável, insiste em opostos... Mas o pior era a forma com que tratava as suas verdades, as verdades que o fizeram não ter muito o que perder em contrariar a vida, porque ela já tinha ultrapassado o limite do absurdo a muito, muito tempo. Tratava a verdade como escudo e como espada, e era muito bom nisso. Não podia se dar ao luxo de destampar qualquer ferida, e talvez pensasse que ferindo, igualaria as chances com os opostos que ele tanto insistia.

E era tanta verdade desnecessária na ponta da língua, falada na cara ou direto no ouvido. Era tanta verdade disfarçada, maquiada, feias, belas e miraculosas que escondia atrás de suas vãs tentativas de brincadeira. Você não sabe brincar. Ninguém brincou com você!

Insiste em opostos... Não sabe brincar... Acabou batendo na porta de um parque de diversões. Eu sou uma brincadeira; para me brincar não existe faixa-etária, tamanho ou o peso que seu passado tenha. Me adéquo a tua imensa falta de jeito, que faz você desperdiçar todo riso e grito preso que guardas com tanto zelo, sei lá para quando usar. Eu palhaça, sem maquiagem, mas com a ponta do nariz redonda e vermelha, distribuo exageros por ai, não sei como seria viver assim. Não vá embora até a última luz se apagar, por que, para quem mais irá sorrir de verdade se não for para mim?

Fica, que os créditos são pontos brancos no escuro. Ninguém lê, mas enquanto todos saem do cinema, eu te escondo atrás dos bancos, e te faço rir mais uma vez... Duas, três. E se ainda permanecer é para ser feliz. Brincar de esconde-esconde para eu acabar de contar, te procurar e rezar baixinho para você voltar. E te ver voltar correndo para marcar pontos e depois me zoar. Só não fecha o olho porque eu giro muito rápido. Fica atento aos movimentos, as imagens se destorcendo e não pensa em coisa ruim que é para não vomitar. Mas, por favor, fica? Sou uma brincadeira, venha me ganhar!

Te mostrarei minhas feridas, se me deixar cuidar das tuas, e prometo não te ferir com a ponta da língua afiada que também tenho. Não vejo porque usar com você. Mas vem de verdade, por que quem não brinca de verdade, escolhe consequência!


– Ully Stella


Cleptomaníaco De Olhares





O mundo pode ser seu
você só deve ser ou estar
porque o belo te elegeu
para se mostrar” Calcanhotto








Cleptomaníaco de olhares. De nada te serve meu olhar, mas insiste em me roubar. Eu poderia estar olhando agora para toda essa gente desinteressante e comum, e você vem de algum Oasis só para me seqüestrar do cotidiano. Meus hormônios estão histéricos por tua causa. Te querem de forma impessoal e inapropriada para esse ambiente. Não querem saber teu nome, idade, telefone, se é judeu, ateu ou gay; Te querem... em cima, em baixo, dentro e bem longe de mim. Meus olhos antes desatentos, agora só sabem te atentar, te perseguir. Meu olfato me suplica teu cheiro de novo, meu tato se apaixonou pelo teu couro e eu faço um esforço sobrenatural para manter a minha boca fechada, para não babar um mar inteiro de vontade de você.

Me diz, como é ser você? Como é ser um sonho? Como é acordar e saber que tem pessoas que pagariam cada respiração tua ao lado delas? Como é mover pescoços desconhecidos para você só de você existir e andar por ai?

Já percebeu que quando você quer sair dos lugares, as pessoas em volta se revoltam, brigam, gritam... elas sabem (como eu), que você deveria estar em algum trono como imperador do reino dos belos, ou preso em alguma pintura secular que vale bilhões. Mas não, você esta ali, mistificando um dia dos nossos miseráveis dia-a-dia, assombrando a idéia que tínhamos sobre beleza até você chegar debochando da forma que nos esforçamos para ficar um pouco mais bonitos.

Não me olhe, não acene, não me chame para sentar com você... Não tenho absolutamente nada que eu queira te dizer. Mas te levaria para dançar um tango, te faria mágicas, ouviria cada desafino do teu violão suspirando forte para não morrer sufocada. Me temperaria ao seu gosto, serviria quente, com uma piscadela e sugerindo que não esperasse esfriar. Te queria enquanto uma lua dura no céu de uma noite. Depois? Depois suma! Suma antes do sol aparecer, me deixe dormindo, acordarei de um sonho para chorar baixinho uma ilusão. Suma mesmo querendo ficar, porque eu não quero me acostumar com a tua beleza e na semana seguinte ela me parecer normal.

Fiz uma visita a outro país, fui mais uma turista no museu, a contemplar aquela pintura que só é publica porque ninguém tem dinheiro suficiente para comprá-la. Te olhei com pressa e infinitamente, morrendo de medo de perder algum detalhe seu, jurando gravar na memória a vida inteira, minha paixão por aquela obra que Deus fez num dia em que acordou de bom humor. E fui embora... Peguei o avião da imaginação de volta para o cotidiano. Sei que tentarei por alguns dias ou meses calar a vontade de ser coincidência só para te ver novo. Mesmo sabendo que a graça que sustenta todo sonho é só essa vontade, que quando conquistada, pode banalizar todo o resto.


– Ully Stella

segunda-feira, 10 de outubro de 2011

Bel-Prazer









Mas eu persigo o que falta
Não o que sobra
Eu quero tudo
Que dá e passa
Quero tudo que se despe
Se despede e despedaça.” Lenine






Confundo as cinzas de uma manhã fria; fumaça e neblina. Enterrando meus erros na terra preta, confundo com tua pele morena. Cavo com mais força, não encontro nada. Despejo o que preciso e cubro de novo. Confundo tuas santas verdades com a minha curiosidade no que ainda não me disse. Quebro um copo, vejo teu rosto na parede, confundo minha falta de paciência com violência e te soco, mas soquei a parede.
 Embriagada, vomitando meus resquícios, confundo a importância de respirar com a sua importância. Porque se ao invés de minhas brincadeiras casuais, te dissesse ao certo o que sufoca minha garganta, me trazendo de volta o ar, minha falta de fôlego seria tua então.

Confundo a verdade com o que quero que imagine;
Confundo vontade com o que quero que nunca termine;
Confundo minhas vaidades com a beleza de um menino.

Te confundo, bem no fundo, no fundo da minha alma frustrada em não te conseguir um pouco mais inteiro depois de qualquer tequila. Te confundo lindo por trás de todo meu eu sujo. E quando te vejo... Ah... me confundo mais! Sua presença me cega, me amolece. Passo a não precisar de mais nada. Não reclamo, me derramo, esqueço o que eu queria dizer... E tu vais embora, sem olhar para trás e dar um pouco de esperança que voltarás, para quem só vira as costas depois que tu já tenha virado a esquina, sumido da vista. Ás vezes demora até mais. Fico esperando você voltar correndo, e rindo, me dizer que não retribuiu o olhar por brincadeira, só para ver se eu iria esperar.

Enquanto degusta e tenta digerir meu banquete de mim, que te sirvo bel-prazer, te olho indo para longe, sumindo da vista e morrendo de fome de você.
Confundo meu sincero momento com a pressa de te devorar inteiro.

– Ully Stella

sexta-feira, 7 de outubro de 2011

Inconvenientemente



Tenho a boca tão cheia de sinceridades, que ser bem educada só seria possível se eu fosse muda. Preciso falar, e falo de boca cheia, por isso até o meu “Bom Dia” te deprime.  
A verdade não é só para quem deseja ser bom, correto, íntegro, justo ou apenas chato. A verdade já carrega todo amor, ódio, ironia e inconveniência que nossas vidas poderiam suportar. E muitos não suportam.

A mesma verdade que me faz ser grossa, me faz ser boba; me arma para longas batalhas e me faz nua, vulnerável; me faz ter amigos e também opostos, sempre tão dispostos a contradizer minhas verdades, quem sabe até inventando outras verdades, logo assim, mentindo. Esses estão entre os que não suportaram.

Me perco na tenuidade entre a verdade e a sinceridade – Que são coisas completamente diferentes  –.  Existem verdades que perduram desde o início do século, desde a criação do homem, desde ontem... Mas sinceridade sempre foi momentânea. É o que sentimos e achamos, é um impulso bruto, que também nem todos sabem controlar ou expressar.
Isso explica tantos “eu te amo” que não são amor, tantos “pra sempre” que não viraram nem a esquina. A eternidade e o amor são verdades que surgem de sinceridades que foram cultivadas. Havia sinceridade mas não todo o amor necessário para desenvolver a verdade que a eternidade precisa. Saudade é uma velha sinceridade aflita, esquecida, que chora por saber que é capaz de esquecer.

Mas tudo isso cansa. Ser sincero perde um pouco do sentido quando o tempo é quem faz as verdades. Mas é importante ser, porque mesmo que muito mais da metade de toda sua sinceridade vá ser perdida, são pequenas sinceridades, criadas com carinho, que se tornam verdades inteiras. Mentiras não tem derivações, pequenas ou grandes, aprimoradas ou desculpadas, ainda são mentiras. E omitir o que se sente não é mentir, é não ser sincero, é não acreditar que o tempo seja capaz de trazer uma verdade a ti.

Sou inconvenientemente sincera, esbanjo meu otimismo em todo canto esperando que germine coisa boa. Mas não estaria sendo sincera se dissesse que sou verdadeira, não o tempo todo, porque quem vive para colher verdades, sabe que a verdade dói muito mais do que cura. E eu, ás vezes, sou umas dessas que não suportam muito.

– Ully Stella