terça-feira, 20 de março de 2012

Rua da Satisfação Esquina Com o Apego

“Eu não quero viver pra morrer de saudade”  Nando Reis


Se a vida me dá um cômodo, me acomodo. Pode ser um cômodo apertado ou uma mansão me acomodo da mesma forma. Vivo, respiro, crio possibilidades, enfeito tudo e sou até feliz. A vida me fez uma satisfeita nata. E até isso ela veio me cobrar de volta. A minha satisfação perante as coisas agora é a maior das minhas instabilidades. A pergunta que foi implantada e que criou raízes rápidas na minha mente é: “Eu também não estava satisfeita antes?”.

Como uma pessoa que se muda de um apartamento apertado no centro da cidade e vai para uma casa grande no campo, só percebo e valorizo o espaço e ar limpo quando já estou longe do que me apertava e sufocava. Uma vez acomodada, não percebemos a real dimensão dos problemas. Entenda, estou satisfeita nesse exato momento, sou feliz agora, mas não sei de fato se estou respirando poluição ou ar puro. Não sei se estou apertada, pequena, torta e corcunda ou se estou de bobs no cabelo, deitada sobre um futon de seda sendo servida na boca. Só saberei quando essa fase acabar e eu puder comparar o que me foi roubado, acrescentado, perdido, desperdiçado...

Ficaria feliz se essa fase acabasse e eu percebesse que isso tudo é só mais um exagero meu, que não há impossibilidades nesse romance, que eu não posso ser inteiramente tua, e eu não basto para traduzir o amor, não sirvo nem para ensina-lo a dançar ou entrar na dança. E se minhas frases começarem a perder o sentido? E se eu perceber que meu sono não é velado, que eu não sou desejada, esperada, que não tenho sonhos compartilhados? E quando o meu fôlego for acabando, por favor, se dê ao trabalho de ligar para a ambulância, que antes das portas serem fechadas olharei breve e eternamente para minha antiga moradia, e naquele instante, já longe, me certificarei que decorei e morei sozinha.

Me chame de louca mas não admita que eu estou certa. Mais uma vez. Eu quero somar, não encerrar a conta. Mais uma vez!!! Não quero me mudar, não quero empacotar e desempacotar nada, não quero ensinar como eu sou a mais ninguém. Não se engane, me satisfarei de novo, serei feliz de novo, só não quero acrescentar a minha coleção de “coisas que fico feliz que tenha acabado” mais uma residência enfeitada e tão linda como a nossa. Quero a plenitude de uma felicidade verdadeira, quero saber diferenciar satisfação de apego. Para não cairmos em tédios providenciais, que nos mudemos de mês em mês para uma casa maior, mas que seja a nossa. Não seja mais uma experiência. Seja meu produto final!

– Ully Stella



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